quinta-feira, 8 de abril de 2010

"Você está em pé diante da mesa mexendo nos papéis e deixa cair uma coisa. Só que você não percebe. Você leva um segundo ou dois para perceber, e mesmo assim você só se dá conta de uma distorção informe do espaço pululante em torno de seu corpo. Mas depois que você percebe que deixou cair alguma cosa, você ouve o ruído do objeto batendo no chão, com retardo. O som chega até você após atravessar uma imensa rede de distâncias. Você ouve o objeto cair e ao mesmo tempo percebe o que é, mais ou menos, e é um clipe de papel. Você sabe que é isso com base no som que ele faz quando bate no chão e na memória recuperada da queda em si, o objeto caindo de sua mãe ou da beira do papel ao qual estava preso. O clipe escorregou da beira do papel. Agora que você sabe que o deixou cair, se lembra de como foi que aconteceu, ou se lembra em parte, ou meio que mais ou menos vê a cena, ou então outra coisa. O clipe de papel bate no chão e quica, insignificante e sem peso, um som para o qual não existe onomatopéia, o som de um clipe caindo, mas, quando você se abaixa para pegá-lo, ele não está lá."
(páginas 87 e 88, primeiro parágrafo).

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